segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Raízes do SUP parte II - Entrevista Herbert Passos Neto

Foto de 2005. Primeiro remo foi comprado em uma loja de pesca

Jornalista, especialista em esportes de prancha e atual presidente da Associação Santos de Surf, Herbert, que foi um dos pioneiros do esporte no Brasil  e a  primeira pessoa em Santos a praticar a versão moderna do Stand Up Paddle, conta um pouco sobre os primeiros anos de SUP Surf no Brasil e as dificuldades que encontrou para fazer prancha e remo de SUP quando ninguém sabia ao certo o que era isso.
Pesquisador da história do surf brasileiro, ele também revela que antes do surgimento do SUP moderno, nos anos 2000, Osmar Gonçalves e outros pioneiros do surf brasileiro, além de surfar, usavam remos em suas pranchas para remar de pé nos dias de flat na praia do Gonzaga, em Santos, no final da década de 30 . Fato que abre um precedente para que se reveja a história do esporte no Brasil. 


Sem muitos referenciais, as manobras saiam institivamente
SC- Qual foi o referencial em que você se baseou para fazer esse SUP? Já existia alguém usando SUP no Brasil? De onde surgiu a idéia?

HP - A idéia surgiu em 2004, quando resolvi fazer uma prancha bem grande para remar nos dias de flat, praticar tandem (duas pessoas na prancha) e experimentar o stand up, que já começava a aparecer em cenas de filmes e fotos de revistas, mas ainda não era difundido.

O stand up não era o principal objetivo, mas logo percebi o potencial da brincadeira quando aprendi a usar o remo.


Quase não havia referência. Quem já usava uma stand up era o big rider guarujaense Haroldo Ambrósio, que havia sido visto em Maresias com uma 11 pés, botando pra baixo em ondas de 2m.  Antes dele e de Jorge Pacelli, a única notícia de gente remando em pé era de Murilo Brandi, em Guarujá, há muitos anos atrás, com uma prancha gigante que ele tinha.

SC - E como foi a conversa com o Neco e o pessoal da Silver Surf? Como foi que vocês pensaram as medidas da prancha, material? 
 
HP - Fazer uma prancha de surf com 13 pés foi ao mesmo tempo um desafio e uma novidade para todos. Demorou mais de seis meses pra ficar pronta.

O shaper Neco Carbone me ajudou a definir as medidas, tomando como base os longboards clássicos de 12 pés que eu tanto admiro. Acabou ficando com 26,5 polegadas de largura e 5 de espessura.

Como não havia bloco, encomendei um kit especial da Keahana, mas o primeiro bloco ficou fino e acabou sendo usado como régua para Neco Carbone desenhar uma curva (em uma cartolina) para que fosse produzido um novo bloco com 3 longarinas. A sala dele não cabia a prancha e ele teve que shapear na sala da Silver Surf, onde foi feita a laminação.

A idéia era fazer uma prancha durável para compensar o preço, por isso pedi 3 tecidos em cima e 3 em baixo. Foi preciso dois laminadores (Adriano Teco e Fernando Mizi) trabalhando ao mesmo tempo.

 "A prancha demorou mais de seis meses para ficar pronta ... pesava quase 25Kg"  

SC - E os remos? como foi o processo até voc ê chegar a um "ponto ótimo"?

HP - Meu primeiro remo foi comprado em uma loja de pesca na Ponta da Praia. A pá era pequena, mas foi bom pra entender como funcionava na onda. O segundo remo foi um de caiaque. Arranquei uma das pás e adaptei uma empunhadeira com uma conexão de tubulação em "T". Funcionou melhor, mas afundou depois da primeira vaca. Perdi dois.

Como pouca referência, tudo era experimentação e continuei buscando informação, tanto aqui como em outras localidades. Cheguei a me corresponder bastante com Magno Matoso, de Florianópolis, que estava construindo pranchas de stand up na mesma época.

No Centro Náutico São Vicente consegui um modelo de pá de canoa olímpica que foi reproduzida em fibra pelo Diego da Evolution, adaptando um cabo grande pra eu remar em pé. Só depois ele fez um com pá de canoa havaiana.

Ambos funcionaram bem. Arrisco dizer que a pá de canoa olímpica era melhor pra "navegar" a prancha, que pesava quase 25kg e mais parecia uma embarcação.



Uma das primeiras pranchas específicas para  SUP quase pronta
SC  - agora conta como foi chegar no crowd remando de pé em 2005? 

HP - As reações foram as mais variadas. Uns não gostaram, pois eu entrava na onda bem mais no outside do que as longboards e realmente era perigoso se caísse e a prancha acertasse alguém, mas nunca aconteceu. Outros pediram para experimentar e acharam difícil se manter em pé.

Pra mim, que tinha sofrido uma lesão no menisco (parte da articulação do joelho) pouco antes da prancha ficar pronta, o stand up foi perfeito para fortalecer as pernas e retomar o condicionamento físico. Acabei gostando e fiquei mais de um ano surfando só de stand up.  A galera acabou acostumando, já que eu não era fominha.

Só quando começaram a aparecer as pranchas menores, um ano depois, feitas inicialmente pelo Fabio Chati, de Ubatuba, é que a modalidade começou a se popularizar. Inclusive foi ele que fez a primeira prancha do Picuruta e isso com certeza teve grande influência na disseminação do esporte.

Com o novo remo, usando uma pá de canoa olímpica adaptada a um cabo maior e mais à vontade com a prancha
 
SC – Agora, tem uma história, ou melhor, “pré-história”, do SUP brasileiro que a gente precisa levantar. Provavelmente você a conheça... O Osmar Gonçalves e sua turma de pioneiros do surf da década de 30/40 usavam remos para remar em pé quando não tinha onda, inclusive, lembro que há uns três anos fui na Surf Store e o Marcelo (empresário dono da Surf Store)me chamou pra ver umas fotos que um senhor estava mostrando. Eram da década de 40 (acho). Ele (o senhor) em cima de uma prancha gigante ‘a lá Thomas Rittcher’ usando um remo de madeira, em pé sobre a prancha.  

HP - A prancha que você citou provavelmente era um sondolin, um tipo de embarcação comum nos clubes nessa época. Era usada pra remar, pescar, fazer travessias e passeios pela baía. A julgar pelo formato, foram inspiradas pelo mesmo projeto da prancha do Thomas, que é uma "hollow", projeta por Tom Blake em 1926. O projeto dessa prancha foi publicado na Revista Popular Mechanics em 1937 e foi a partir dela que os nossos primeiros surfistas construíram suas pranchas. Além do surf, eles faziam vários experimentos, utilizando remo e até vela nas pranchas, como mostram algumas fotos.

Osmar Gonçalves: pioneiro também no SUP
"Não sei dizer a frequência, mas eles praticavam a remada em pé" (Sobre os pioneiros na década de 30, em Santos)

SC – E você tem alguma informação se eles remavam de pé regularmente? Porque isso colocaria o Brasil praticamente ao lado do Hawaii em termos de raízes do SUP...

HP – Não sei dizer a frequencia, mas eles praticavam a remada em pé, sentados e também deitados, mas neste último caso sem o remo. Na época a cultura de praia estava ganhando força e a existência das pranchas abriu novas possibilidades de diversão. Nessa era "pós Duke", Santos com certeza é uma das cidades que há mais tempo adotou as pranchas como parte do estilo de vida, seja para surfar, remar ou velejar.

SC - Para finalizar, você que viu o esporte nascer por aqui, acha que ele já atingiu a "maturidade" ou ainda tem muito para crescer? Como você vê o SUP nos próximos anos?

HP - Inicialmente houve uma tendência de reduzir o tamanho das pranchas para torna-las mais manobráveis e isso ajudou a atrair adeptos entre os surfistas. Agora, as pranchas de travessia atraem também os não surfistas.

Além de continuar evoluindo como esporte nas ondas e nas travessias, creio que o stand up vai se firmar com item integrante da cultura de praia, proporcionando diversão e saúde a pessoas de todas as idades.

Na parte III dessa série, você vai ficar sabendo um pouco mais sobre o Stand Up Paddle praticado em Santos no final da década de 30. Aguardem... em breve no SUP CLUB! 

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